A PRECARIEDADE POLITICAMENTE INDUZIDA E O EMPREENDEDOR DE SI MESMO NO CASO UBER: Sob uma perspectiva de diálogo entre Butler, Dardot e Laval.

Foto: Divulgação

Por Daniele Barbosa | Editora Lumen Juris 

O presente livro, apoiando-se em Judith Butler, Christian Laval e Pierre Dardot, busca investigar se estaria em curso, no Brasil, uma política de precariedade induzida da vida dos motoristas em plataformas digitais de transporte e de que modo o Estado brasileiro estaria operando para a construção de um enquadramento de empreendedor de si mesmo. Foram ouvidas, para esse fim, as vozes dos motoristas da empresa Uber, no período de 2018 a 2019. Além disso, foram analisadas as principais alterações legislativas em relação ao tema, bem como decisões judiciais.

Saber se o Estado brasileiro, ao estimular a construção de um determinado enquadramento, está produzindo uma violência, geradora da maximização da precariedade da vida desses trabalhadores, parece fundamental para uma luta por condições que possam tornar as vidas mais vivíveis. Enxergar esse enquadramento é necessário, se pretendemos gestar resistências que afirmem que esses corpos precários importam!

Daniele Barbosa

Membra da Rede Trabalho em Cena. Professora de Direito do Trabalho na UERJ (2017 a 2019) e professora convidada na pós-graduação no CEPED/UERJ. Idealizadora dos projetos “Trabalhadores de Apps em Cena” e “Trabalho em Cena”. Criadora da página @trabalhadoresdeappsemcena. Advogada.

Prefácio

Wilson Ramos Filho (Xixo)

Não é bom viver no Brasil atual. O sentimento de mal-estar social invade diversas dimensões de nossas vidas.

Esta constatação empírica desafia os operadores jurídicos a propor explicações racionais que se constituam em diagnósticos, essenciais para que se inicie o necessário movimento que visará à transformação da realidade.

Este instigante livro, resultado das pesquisas da autora no programa de mestrado da UFRJ, surge durante a pandemia que, pelos impactos sociais e econômicos que causou, possibilitou a percepção da importância do trabalho humano na sociedade brasileira atual.

Além disso, foi desenvolvido no contexto histórico que se inicia com o golpe de estado de 2016 que implantou, sem pudores ou escaramuças, o ideário neoliberal, primeiro com Temer, o usurpador, depois com Bolsonaro, o obscurantista.

Essas adjetivações duras se fazem oportunas para que entendamos a dramaticidade, ética e civilizatória, da destruição de direitos sociais que enseja a utilização, também epidêmica, do trabalho humano precário por intermédio de aplicativos.

O livro da professora Daniele Barbosa consegue, a partir de pesquisa qualitativa, desmistificar o chamado empreendedorismo daqueles que, por não terem mais nada para vender, comercializam-se, mercadorias, em longas jornadas de trabalho, sem direitos ou garantias, sob veladas formas de subordinação, para sobreviver, para “ganhar a vida”, gerando lucros para os acionistas de plataformas digitais.

Trata-se de um livro jurídico que, sem dúvida, inova na abordagem contaminando os enunciados normativos e jurisdicionais com a vida real de todos nós e com as vidas que, perdidas, não merecem o luto, com as vidas daqueles que são explorados como empreendedores de si mesmos. São vidas que não importam. Essa superexploração precarizadora está na raiz do mal-estar em muitos daqueles que não se deixaram colonizar pelo frequente elogio da maneira capitalista de existir em sociedade.

A regulação incidente sobre o trabalho humano explorado, drasticamente precarizada pela reforma trabalhista, adquire na realidade atual requintes de crueldade pela aplicação ideologicamente comprometida que vem recebendo por parte do judiciário trabalhista e da corte constitucional, em termos gerais e, no caso dos motoristas de aplicativos, especificamente, de modo perverso.

Por possibilitar entender um pouco melhor os mecanismos de normalização dessas atrozes iniquidades e profundas injustiças, este livro, redigido talentosamente para melhor se comunicar com os leitores, certamente servirá de fonte para outras pesquisas científicas futuras, mas sua principal virtude é outra, vai além: permite que leitores mais argutos percebam vários dos mecanismos de dominação que constituem as relações capitalistas de produção que, um dia, haverão de ser superadas.

Boa leitura.

Curitiba, outubro de 2020

Wilson Ramos Filho (Xixo)

Doutor em Direito, professor na Universidade Federal do Paraná (UFPR), professor titular de Direito do Trabalho no mestrado das Faculdades Integradas do Brasil (UNIBRASIL), professor na Universidade de Pablo de Olavide (Sevilha, Espanha) e presidente do Instituto Defesa da Classe Trabalhadora (DECLATRA).

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