O combate ao trabalho infantil durante as férias escolares
Por Isadora Raupp | Nexo Jornal
De 2019 a 2022, o trabalho infantil aumentou no Brasil, divulgou o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) no dia 20 de dezembro. A alta reverteu uma tendência de queda no país, que foi registrada antes da crise sanitária da pandemia de covid-19.
1,9 milhão de crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos estavam em situação de trabalho infantil em 2022, o que representa 4,9% das crianças brasileiras nessa faixa etária
No período, em termos absolutos, o número de pessoas nessa faixa etária que desenvolviam atividades econômicas subiu de 1,8 milhão para 1,9 milhão, uma alta de 7%. A probabilidade de o problema acontecer é ainda maior nas férias escolares, alerta a Justiça do Trabalho.
Neste texto, o Nexo explica os danos do trabalho infantil e indica o que fazer ao presenciar a prática.
O que é trabalho infantil
Segundo a OIT (Organização Internacional do Trabalho), trabalho infantil é toda a atividade que é perigosa e prejudicial para a saúde e o desenvolvimento mental, físico ou moral das crianças e que interfere em sua vida escolar.
A prática é ilegal e priva as crianças e adolescentes de uma infância saudável. De acordo com a OIT, consiste em uma grave violação dos direitos humanos e dos princípios fundamentais do trabalho, em uma antítese do trabalho decente.
168 milhões de crianças e adolescentes foram submetidos a trabalho infantil no mundo em 2023, segundo estimativa da Unicef, órgão da ONU para a infância
Na maior parte das vezes, diz a OIT, a situação de trabalho infantil é causa e efeito da pobreza e da ausência de oportunidades e impacta o desenvolvimento não só da criança e do adolescente, mas da nação como um todo.
No Brasil, como regra geral, o trabalho é proibido para quem não completou 16 anos, e permitido a partir dos 14 como aprendiz. De janeiro a abril de 2023, o Ministério do Trabalho e Emprego resgatou 702 crianças de trabalho infantil no Brasil.
Os meninos são os mais atingidos pelo problema: 65,1% dos trabalhadores infantis. Entre as 1,9 milhão de crianças que trabalham no país, 66,3% são pretas ou pardas, segundo o IBGE, o que supera a sua porcentagem dentre o total de crianças e adolescentes no país (58,8%).
O aumento no Brasil
Em 2022, das 38,4 milhões de crianças, 1,88 milhão trabalhavam, 4,9% dessa população.
No início da série histórica, que o IBGE iniciou em 2016, o percentual de trabalho infantil era de 5,2%. Recuou para 4,9% em 2017 e 4,8% em 2018. Atingiu o menor patamar, de 4,5%, em 2019.
O instituto interrompeu as estatísticas em 2020 e 2021 por causa das restrições impostas pela pandemia de covid-19, e retomou em 2022, quando a taxa voltou aos patamares de 2017.
Segundo o IBGE, uma das explicações para a situação de trabalho infantil ter piorado no Brasil foi justamente a crise sanitária e a vulnerabilidade econômica, o que deixou crianças mais suscetíveis à necessidade de angariar dinheiro para a família. De acordo com a OIT (Organização Internacional do Trabalho), a pandemia de covid-19 agravou o problema no mundo. Em 2021, o número aumentou pela primeira vez em duas décadas, segundo a organização.
R$ 716 é o rendimento médio habitual de pessoas entre 5 e 17 anos em situação de trabalho infantil, segundo o IBGE
O levantamento também aponta que a frequência escolar entre os trabalhadores infantis é menor. Enquanto 97,1% da população entre 5 e 17 anos frequenta a escola, na parcela em situação de trabalho infantil, essa porcentagem cai para 87,9%.
O agravamento nas férias escolares
Segundo o TST (Tribunal Superior do Trabalho), as festas de fim de ano e as férias escolares agravam o risco de situação de trabalho infantil. Com a pausa nas atividades educacionais, meninos e meninas passam a trabalhar principalmente como vendedores ambulantes, em regiões comerciais de centros urbanos e em áreas turísticas de lazer, como praias, rios, terminais de transporte e embarcações.
Por isso, o tribunal lançou a campanha “Férias Sem Trabalho Infantil”, em parceria com o Ministério Público do Trabalho e com a FNPETI (Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil), dando mais visibilidade ao tema, principalmente nas regiões turísticas.
A atividade de vendedor ambulante é um dos trabalhos incluídos na lista TIP, decreto do governo federal de 2008 que elenca e proíbe as piores formas de trabalho infantil, em uma metodologia elaborada com apoio da OIT, Unicef e outras entidades.
Esse tipo de trabalho envolve risco de acidente e é prejudicial à saúde e ao desenvolvimento físico, emocional e psicológico de crianças e adolescentes.
De acordo com o TST, as pioras formas de trabalho infantil — venda ambulante de produtos inclusa — deixam essa população exposta a:
- violência;
- atropelamento e outros acidentes de trânsito;
- assédio e exploração sexual;
- consumo de drogas;
- doenças de pele e neurológicas;
- tráfico de pessoas.
Segundo o IBGE, em 2022, 756 mil crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos no Brasil exerciam algum trabalho que está na lista TIP, o que representa 46,2% das crianças em situação de trabalho infantil no país.
Como denunciar trabalho infantil
O TST afirma que a erradicação do trabalho infantil é um dever de toda a sociedade e que todos precisam assumir o protagonismo para combater o problema. A melhor forma de fazer isso é denunciar a prática.
É possível usar os seguintes canais:
- Ministério Público do Trabalho, que recebe denúncias por meio de um sistema próprio.
- Ouvidorias dos Tribunais da Justiça do Trabalho, via formulário de atendimento.
- Conselho Tutelar da cidade.
- Secretaria de Assistência Social da cidade.
- Disque 100 do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, que funciona também no Whatsapp e Telegram.
No Brasil, a defesa dos direitos da infância e o cuidado com as crianças ocorre por meio de uma parceria entre o Estado, a família e a sociedade, algo expresso na Constituição de 1988 e no Estatuto da Criança e do Adolescente. Não existe prevalência de um sobre o outro, e todos são responsáveis por zelar por uma infância saudável.
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Fonte: Isadora Raupp | Nexo Jornal
Data original de publicação: 01/01/2024