Manifesto do Projeto Conexão – Observatório do trabalho por plataformas digitais no Brasil

Imagem: Pexels

Projeto Conexão – Observatório do trabalho por plataformas digitais no Brasil

Em razão do Dia Internacional das Trabalhadoras e dos Trabalhadores, nós, do Projeto Conexão – Observatório do trabalho por plataformas digitais no Brasil, realizamos, em 02 de maio de 2024, o evento “A regulamentação do trabalho por plataformas no Brasil: conquista ou retrocesso?”, no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas (IFCH/Unicamp), para debater sobre o trabalho subordinado às plataformas digitais e os desafios do acesso aos direitos sociais e trabalhistas. Na mesma oportunidade, lançamos publicamente o nosso projeto de extensão, comprometido com este debate, e publicizamos o dossiê “Violações dos Direitos Humanos no trabalho uberizado”, produzido pela Diretoria Executiva de Direitos Humanos da Unicamp. Por meio desta nota, viemos nos manifestar, enquanto pesquisadoras e pesquisadores de uma universidade pública, comprometidas e comprometidos com a extensão e a pesquisa acadêmica engajada, sobre o processo de plataformização do trabalho e as alternativas de regulamentação atualmente propostas. Valemo-nos, neste manifesto, das contribuições que foram feitas pelas pessoas que compuseram a mesa do nosso evento, enquanto convidadas, e que participaram do nosso debate, isto é, pesquisadoras, pesquisadores e trabalhadores por
plataformas, mobilizadas em defesa da concessão e ampliação dos direitos.
Tendo em vista o papel que desempenhamos como projeto de extensão, entendemos que é essencial nos posicionarmos em relação ao Projeto de Lei Complementar (PLP) 12/2024, do governo federal, que visa a regulamentação do trabalho dos motoristas por aplicativos. Em 2023, o governo federal criou um grupo de trabalho (GT) tripartite, no interior do Ministério do Trabalho (MTE), para buscar uma solução referente à regulamentação do trabalho plataformizado. Logo de início já era possível observar uma questão crítica: a despeito dos resultados das pesquisas que têm sido produzidas no interior da academia, referentes ao espraiamento das plataformas para diversos setores, o governo demonstrou interesse em
regulamentar apenas o trabalho realizado em plataformas de transporte e delivery. Após intensas negociações e mobilizações, o PLP 12/2024 foi lançado publicamente e agitado como uma vitória política, sendo encaminhado para o Congresso Nacional com caráter de urgência
— o que, inclusive, já foi revertido, devido à demanda por mais discussões sobre o projeto. O PLP em questão prevê a criação da categoria “autônomo com direitos”, o que, para nós, é visto com bastante preocupação. Isto porque, ao criar essa categoria, e circunscrever a relação dos trabalhadores com a empresa como uma relação de mera intermediação, a proposta reforça a ideia de que as empresas-plataforma são apenas empresas de tecnologia, e não agentes que concretamente gerenciam e controlam o trabalho. Se entendemos que o trabalho subordinado às plataformas digitais é marcado pela instabilidade, insegurança e precarização, aprofundando e naturalizando traços fundantes do mercado de trabalho na periferia do sistema capitalista; que este trabalho é realizado sob demanda e é socialmente desprotegido, ancorado na transferência de custos e de riscos às trabalhadoras e aos trabalhadores, que estão sob constante controle e vigilância de uma gestão algorítmica nebulosa, que define precificações, abonos e mesmo os desligamentos; que este é um trabalho flexível, no sentido de que não são os trabalhadores que estipulam suas jornadas de trabalho e salário; e que mesmo sendo um trabalho que parte da adesão às plataformas, são elas, as empresas, que definem unilateralmente as regras do jogo, a partir dos termos de uso, questionamos: o PLP 12/2024 pode ser visto como conquista ou retrocesso? Com o PLP 12/2024 permanece a desresponsabilização das empresas pelas condições de trabalho, como aquelas relativas à saúde da trabalhadora e do trabalhador, área integrante das políticas públicas de saúde. Também é um problema o fato do PLP preconizar o chamado “tempo efetivamente trabalhado”, desconsiderando aquele tempo de trabalho que não é pago
— quando os trabalhadores aguardam serem chamados para desempenhar suas tarefas. Disto decorrem diversas outras questões, como a carga horária máxima das jornadas. O projeto dispõe de um teto de 12 horas diárias por plataforma, o que significa, na realidade, a definição de uma jornada mínima, e não máxima, de disponibilidade para cada empresa. No que se refere à remuneração, tem-se que o que é disposto como piso, pode transmutar-se em teto, consolidando modelos de exploração intensivas, mas juridicamente aceitáveis. O PLP 12/2024 não representa apenas uma derrota para a categoria das trabalhadoras e trabalhadores que estão sob subordinação das plataformas, mas para o conjunto da classe trabalhadora. É imprescindível considerarmos que, devido ao espraiamento das plataformas para diferentes setores, e a legitimação de formas atípicas de contratação, as consequências do “autônomo com direitos” poderão ser sentidas de forma generalizada, a todas as pessoas que dependem da venda da força de trabalho para sobreviver. Considerando esse terrível cenário, o Projeto Conexão se manifesta contrário ao PLP 12/2024, reivindicando uma regulamentação que seja favorável às trabalhadoras e trabalhadores, e se coloca à disposição de iniciativas que visem fomentar este debate, junto a entidades e organizações coletivas.

Fonte: Projeto Conexão – Observatório do trabalho por plataformas digitais no Brasil

Data original de publicação: 03 de maio de 2024

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