Solidariedade às trabalhadoras e trabalhadores que cuidam de todos nós

Foto: Carla Marques/Ibama-PE

Por Jorge Luiz Souto Maior

As trabalhadoras e trabalhadores que atuam no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (IBAMA) e Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) entraram em greve, por melhores salários e condições de trabalho, a partir de 1º de julho.

No dia 04 de julho, no entanto, o vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), atendendo pedido da AGU, proferiu decisão determinando, sob pena de multa diária de R$200.000,00, a suspensão da greve e o retorno ao trabalho da totalidade dos trabalhadores e das trabalhadoras em greve, sob o argumento de que as atividades paralisadas são da “mais alta relevância para a promoção das políticas públicas de proteção e defesa do meio ambiente, a exemplo da regulação, gestão e ordenamento do uso e acesso aos recursos ambientais”.

​Citou, como exemplo, a “melhoria da qualidade ambiental e uso sustentável dos recursos naturais; a regulação, controle, fiscalização, licenciamento e auditoria ambiental; o monitoramento ambiental; o ordenamento dos recursos florestais e pesqueiros; a consideração dos ecossistemas e das espécies neles inseridas, dentre outras”.
Ocorre que a greve é um direito fundamental, constitucionalmente garantido, “competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender”.

Sobre os serviços ou atividades essenciais, diz a Constituição que a lei “disporá sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade” (§ 1º do art. 9º).

Está óbvio, portanto, que o direito de greve está assegurado mesmo em atividades consideradas essenciais, cumprindo, unicamente, a obrigação em torno do “atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade”.

A Lei n. 7.783/89, que regulou o direito de greve, conforme previsto no art. 9º da CF, a respeito das atividades essenciais estipulou que o início da greve deve ser comunicado com 72 (setenta e duas) horas de antecedência (art. 13) e cabe aos “sindicatos, os empregadores e os trabalhadores”, de comum acordo, “garantir, durante a greve, a prestação dos serviços indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade”.

Não se trata, pois, de uma obrigação exclusiva dos trabalhadores e trabalhadoras e, de todo modo, esta obrigação está relacionada não a um conceito abstrato do que seja essencial ou não e sim à realização dos serviços que se apresentem como “inadiáveis”, aqueles que, nos termos da definição legal, caso não atendidos, “coloquem em perigo iminente a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população”.

A decisão judicial em questão, portanto, fez letra morta da garantia Constitucional e do texto legal.

A proteção do meio ambiente foi tratada como prioritária sobre a própria condição humana daqueles e daquelas cujas atividades se desenvolvem para esta finalidade. Na lógica da decisão proferida, o essencial seria preservar a natureza, mesmo que para isto se sacrifiquem os direitos fundamentais daqueles que, com seu trabalho, dedicação e esforço, protegem a natureza.

Para ter algum sentido jurídico, a decisão precisaria apontar, em concreto, quais atividades seriam tidas como inadiáveis e por quê. Além disso, deveria impor também aos empregadores responsabilidades quanto à realização de tais serviços.

E o pior é que na própria deliberação da greve já se previa a “manutenção de 10% dos servidores nos serviços de licenciamento ambiental e de 100% do atendimento a emergências em unidades de conservação, bem como a continuidade integral dos trabalhos de combate ao fogo por brigadistas e supervisores contratados”.

Ou seja, não havia nenhuma deliberação a ser tomada que não fosse a da garantia do exercício regular do direito de greve, que, de fato e de direito, se apresentava.

Mas não! Para o Judiciário brasileiro como um todo, da Justiça Comum à Justiça do Trabalho, passando pelo STF, se há uma greve é preciso encontrar alguma forma de coibi-la, pouco importando, para atingir este objetivo, o que está consagrado nas Declarações e Convenções Internacionais sobre Direitos Sociais, na Constituição Federal e nas leis.

Não se trata, pois, de uma questão jurídica e sim de uma posição de classe que, por certo, não é a da classe que vive do trabalho.

Assim, resta tão somente revelar a ideologia que embasa tais decisões e expressar solidariedade a quem sofre as consequências concretas desse recorrente ataque institucional aos seus direitos fundamentais, mesmo sendo considerados, como de fato são, essenciais ao todo social.

​São Paulo, 10 de julho de 2024.

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Por Jorge Luiz Souto Maior
Data original de publicação: 10/07/2024

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