Dossiê: Juventude, Trabalho e Educação

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Por Cadernos do CEAS | Revista Crítica de Humanidades

No Brasil, há um conjunto de estudos e pesquisas que destacam a necessidade de compreender a relação entre juventude, trabalho e educação, tanto no Brasil quanto nos países latino-americanos. Esses estudos enfatizam as especificidades sócio-históricas e as implicações nas trajetórias que os jovens percorrem até o ingresso na vida adulta oferecendo pistas interpretativas relevantes para compreensão de aspectos determinantes da transição da escola para o trabalho no Brasil.

Diferentemente dos países centrais do capitalismo ocidental, o padrão de transição escola-trabalho instaurado no Brasil assumiu historicamente contornos bem diferenciados do padrão fordista de transição para a vida adulta., Logo, a suposição de que os jovens ingressam no mercado de trabalho após término da educação formal não encontra sustentação empírica na realidade brasileira. Assim, duas características se sobressaem no padrão de transição escola-trabalho no Brasil: o ingresso precoce no mercado de trabalho e a conciliação entre estudos e trabalho.

Esse achado instigante da realidade brasileira remete à problematização do lugar historicamente atribuído à educação nas trajetórias dos jovens e nos seus processos de emancipação e assunção dos papéis sociais da vida adulta. Além disso, ressalta a necessidade de entendermos as especificidades do sistema escolar e os seus vínculos com o mercado de trabalho. E, por outro lado, coloca em questão a centralidade do trabalho como dimensão sine qua non da juventude, particularizando-a no interior da sociedade brasileira enquanto juventude trabalhadora.

As especificidades da transição escola-trabalho entre os jovens brasileiros colocam em evidência que a construção sócio-histórica da juventude brasileira é mediada fundamentalmente pelo trabalho, um achado da realidade brasileira que não se pode ignorar ao buscar compreender a condição juvenil contemporânea. Mesmo com a expansão do sistema escolar e o consequente prolongamento do tempo de permanência na escola ocorrido nas últimas décadas, o que teoricamente aproxima os jovens de um modelo ideal de vivência da condição juvenil moderna (moratória social), a condição de estudante não eliminou a experiência simultânea do trabalho.

As transformações ocorridas no processo de transição escola e trabalho no Brasil nas últimas décadas indicam que os jovens que vivenciam as situações de trabalhar e estudar simultaneamente não seguem um padrão linear, podendo haver múltiplas combinações conforme o momento da trajetória juvenil e as etapas de escolarização. Assim, a relação entre estudar e trabalhar nas trajetórias juvenis não pode ser tomada enquanto situações estáticas que classificam os jovens em categorias analíticas absolutas.

Neste sentido, a conjuntura política e a crise econômica após o golpe sofrido pela presidenta eleita Dilma Roussef em 2016 contribuíram decisivamente para implementação conservadora das reformas trabalhista, previdenciária e sindical. Associadas à Reforma do Novo Ensino Médio, essas medidas atingiram diretamente os direitos sociais dos jovens em sua diversidade, em especial os jovens pobres, negros, do campo e das periferias urbanas. Além disso, interferiram significativamente nos percursos e nos processos de transição entre escola/universidade e mundo de trabalho; no processo de formação profissional; nas formas de inserção e de contração da força de trabalho juvenil, nas condições de trabalho e de saúde; e na organização e ação coletiva dos jovens trabalhadores., Por conseguinte, essas mudanças também afetaram os horizontes de futuro e vivência da condição juvenil no Brasil.

Assim, esperamos que o dossiê oportunize a ampliação do olhar sobre a compreensão da relação entre juventude, trabalho e educação no Brasil na atualidade, profundamente marcada pela ofensiva da extrema direita, pela necropolítica e neoconservadorismo do governo bolsonarista, com sérias repercussões nas condições de estudo e trabalho dos jovens. Estas questões são relevantes diante das esperanças renovadas pela eleição democrática do presidente Lula em 2022.

Aparecida Neri de Souza (UNICAMP) |Orcid

Doutora em Educação pela UNICAMP. Professora de Sociologia da Educação no Departamento de Ciências Sociais e Educação (DECISE) e Programa de Pós-Graduação em Educação (mestrado e doutorado), Linha de Pesquisa Trabalho e Educação, na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Pesquisadora Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Educação e Diferenciação Sociocultural (GEPEDISC. Tem experiência de pesquisa sobre Relações de Trabalho no setor público enfocando docentes no ensino básico e nas universidades; trabalho e educação; sociologia da educação; sindicalismo docente.

Luiz Paulo Jesus de Oliveira (UFRB) | Orcid

Doutor em Ciências Sociais – UFBA. Professor Associado, Centro de Humanidades, Artes e Letras (CAHL), Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), Campus de Cachoeira/Ba. Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação do Campo, do Centro de Formação de Professores (CFP) da UFRB. Pesquisador Associado ao Centro de Estudos e Pesquisas em Humanidades (CRH/UFBA). Líder do Grupo de Estudos e Pesquisas em Juventude (GEPJUV/CNPq). Tem experiência de pesquisa nas áreas temáticas sobre juventude e precarização do trabalho, juventude e educação; trabalho e educação do campo e formação de professores de sociologia na educação básica.

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Por Cadernos do CEAS | Revista Crítica de Humanidades

Data original de publicação: 09/07/2024

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