Crise do capitalismo sem consumidor é tema de Ladislau Dowbor
Por Luciano Velleda
As pessoas que ganham R$ 500 mil por mês convenceram as que ganham R$ 50 mil que os problemas do Brasil são as pessoas que ganham R$ 1.000. É com essa perspectiva que o economista e professor Ladislau Dowbor explica a lógica por trás do desmonte dos direitos dos trabalhadores em curso no Brasil. Um desmonte contextualizado com a economia paralisada e o empobrecimento geral da população, ao mesmo tempo em que poucos indivíduos enriquecem sem esforço atuando no mercado financeiro.
É para explicar como se chegou a esse ponto, e quais os caminhos para sair dele, que Dowbor participou do programa Entre Vistas de quinta-feira (18), às 22h, na TVT, com apresentação do jornalista Juca Kfouri.
O economista lançou em 2017 o livro A Era do Capital Improdutivo, obra na qual esmiúça o que chama de “financeirização da economia” e o atual modelo de capitalismo predominante no mundo, que ano após ano concentra mais riqueza nas mãos de poucos e aumenta a pobreza e a desigualdade no planeta. No programa, de modo didático, Ladislau explica as transformações econômicas pelas quais sofre o Brasil e muitos outros países.
Segundo o professor, o atual capitalismo está dominado por intermediários financeiros. Como exemplo, pondera que seria possível criticar um capitalista que produz sapatos e remunera mal seus empregados, mas ainda assim, ele produz sapato, cria emprego, compra máquinas, paga impostos e as pessoas podem usar o sapato. “Esse é o capitalismo que nós conhecemos.”
Na atualidade, porém, tudo mudou. Os “capitalistas improdutivos” não produzem nada, e investem suas fortunas no mercado financeiro, obtendo altos lucros sem esforço, sem criar emprego, sem comprar equipamentos e pagando pouco ou nada de impostos. E os lucros são novamente aplicados no mercado financeiro, girando a roda da improdutividade que trava a economia e causa desemprego.
“A lógica é a seguinte: se tem um capitalismo tradicional, produtivo, com muita pequena e média empresa que contribui para desenvolver o país, e você tem um sistema financeiro que se construiu em cima disso e que extrai recursos num volume tal que paralisa. E quando paralisa a atividade produtiva, e quando endivida as famílias, você trava a economia, e quando você trava a economia, você gera menos impostos para o Estado”, explica Ladislau Dowbor.
O economista pondera que o empresário produtivo não precisa de discurso ideológico. Ele precisa é de demanda para ter para quem vender, e crédito barato para poder investir. “Isso funciona”, afirma, dando como exemplo os governos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, período que o Banco Mundial chamou de “a década dourada do Brasil”.
“Ajuda o bem-estar das famílias, ajuda a atividade empresarial, e como a atividade de consumo gera muitos impostos para o Estado, e a atividade empresarial gera também impostos para o Estado, a conta fecha”, afirma. Neste processo, ele destaca que o Estado tem então condições de investir em infraestrutura, o que irá também baratear o custo das empresas, e ainda permite financiar as políticas sociais, como a escola pública, o SUS, a segurança pública, entre outras.
“O conjunto do sistema passa a girar num ciclo virtuoso, em que as famílias consomem mais, as empresas agem mais, e o Estado tem mais condições de fazer funcionar o conjunto”, afirma. “A redução da desigualdade dinamiza o conjunto das economias.”
O professor enfatiza que todo esse processo de desenvolvimento econômico é conhecido. Não há novidades. E cita como exemplo a China, a Coreia do Sul, o Canadá, a Alemanha e os países nórdicos. “O que aconteceu com o New Deal, nos Estados Unidos, ou com o estado de bem-estar social, na Europa, todas experiências extremamente positivas de desenvolvimento, ao mesmo tempo reduziram a desigualdade e dinamizaram a economia.”
Um raciocínio que, ele explica, é essencial e não é complexo. Ou seja, ao dinamizar a capacidade de consumo da base da sociedade, em um país cuja economia tem uma grande capacidade ociosa, as empresas têm condições de responder a essa demanda sem causar inflação, equilibrando oferta e demanda.
Ao longo de quase uma hora de programa, Ladislau Dowbor ainda aborda as taxas de juros pagas pela população e a alta lucratividade dos bancos. Define como “covarde” os juros cobrados, por exemplo, na compra de uma simples geladeira. “É um grau de enganação, é uma covardia. Esse cidadão nunca entendeu de juros e precisa da geladeira.”
Participaram do Entre Vistas a psicóloga Lourdes Alves de Souza e a economista Ione Amorim, do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).
Confira a entrevista na íntegra
Fonte: RBA
Data original de publicação: 18/07//2019