Da falsa ideia de empreendedorismo e autonomia à dura realidade da exploração algorítmica do trabalho de entregadores. Entrevista especial com Henrique Amorim
Por Ricardo Machado e João Vitor Santos | Instituto Humanitas UNISINOS
“Pesquisador destaca que muitos entregadores, ao mesmo tempo que reproduzem a ideologia do empreendedorismo, se veem forçados à submissão das condições de trabalho das plataformas de aplicativos.
Durante muito tempo, existiu a ideia de que o trabalho via empresa de plataforma traria liberdade ao profissional e as próprias organizações apostavam nesse discurso. Não demorou muito para essa falácia ser desconstruída pela dura realidade de exploração desses trabalhadores, a custo de muito suor, longas jornadas e baixíssima remuneração. “Longe de trabalhar como entregador por conta de um desejo de se tornar microempreendedor, o entregador está lá, na imensa maioria das vezes, por falta de alternativa a outras formas mais dignas de trabalho, ou seja, o que caracteriza o engajamento a esse tipo de trabalho não é uma adesão voluntária, mas uma ‘adesão social compulsória’”, destaca o sociólogo Henrique Amorim, em entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line.
Segundo o pesquisador, é histórico que “empresas se aproveitem de fragilidades e vulnerabilidades sociais”. Assim, num contexto de desemprego ou subemprego elevados, não é difícil imaginar como as plataformas digitais, embaladas por um discurso que promete a disrupção e a flexibilidade, encontram uma legião de força de trabalho solicitando ser aceita. “As plataformas digitais de entrega se aproveitam de um contexto de desemprego e de informalidade como o brasileiro para criar e ampliar suas taxas de lucro”, reitera.
Assim, no fim das contas, o empreendedorismo se esvai e se reproduz a velha lógica de exploração da força de trabalho. Mas, segundo Amorim, há uma novidade nessa exploração do século XXI: a algoritmização. “Este gerenciamento algorítmico funciona como um controlador de tempos e movimentos, nos moldes tayloristas, do trabalhador individual e coletivo submetidos às plataformas digitais”, explica. “Ao mesmo tempo, o gerenciamento algorítmico controla, por exemplo, quem recebe cada pedido, o tempo gasto na realização das entregas e os valores que serão cobrados, coordenando de maneira minuciosa o conjunto dos trabalhadores conectados à plataforma digital, além de coletar dados e vigiar os entregadores por geolocalização. Desta forma, os ganhos da empresa são potencializados, pois o serviço passa a ser produzido com maior grau de eficiência e eficácia e com controle em tempo real”, completa.
Henrique José Domiciano Amorim é professor associado de Sociologia e do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal de São Paulo – Unifesp-Campus Guarulhos. Coordena o Grupo de Pesquisa Trabalho e Classes Sociais – GPCT desde 2011. Realizou pós-Doutorado na Universidade de Campinas (IFCH e CESIT) – Unicamp e na École des Hautes Études en Sciences Sociales – EHESS, em Paris. Graduado em Ciências Sociais, ainda possui mestrado e doutorado, todos realizados na Unicamp. Entre as publicações, destacamos Trabalho imaterial: Marx e o debate contemporâneo (São Paulo: Annablume, 2018).”
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Fonte: Instituto Humanitas UNISINOS
Data original da publicação: 29/07/2020