Dois anos após resgate do trabalho escravo, família boliviana volta para jornada exaustiva

Foto: Yan Boechat/Repórter Brasil

Por Daniela Penha | Repórter Brasil

Enquanto Ana* e o marido esperam pela indenização de seus direitos, as quatro filhas se alimentam de doações. Há dias em que a comida só é suficiente para as crianças. “Eu perdi as esperanças de receber algo. Nós pensávamos que aqui a Justiça seria mais rápida do que na Bolívia, mas não há justiça para nós”. 

A fome e as contas não esperam. Dois anos após serem resgatados de uma oficina de costura em trabalho escravo, o casal boliviano continua trabalhando em turnos exaustivos, das 7h até 1h da madrugada, com serviços informais que pagam no máximo R$ 3 por peça de roupa. Sobrevivem com a ajuda de doações, serviços que prestam para uma ONG e auxílio social. 

Entre junho e setembro de 2020, os dois costuraram para a Program, que se autointitula “a maior marca plus size do Brasil”, em situações desumanas no centro de São Paulo. A Anfa, empresa que responde pela marca, foi condenada em primeira e segunda instâncias por manter a família, e uma outra funcionária boliviana, em situação análoga à de escravo.

O Tribunal Regional do Trabalho determinou em fevereiro deste ano que a empresa pague indenização às vítimas em caráter imediato. A empresa, no entanto, recorreu e agora o processo tramita no Tribunal Superior do Trabalho (TST). 

A Defensoria Pública da União (DPU) instaurou a “execução provisória” e cobrou, em março, o pagamento de R$ 364,3 mil, em valores atualizados. Até a publicação desta reportagem, a 10ª Vara do Trabalho de São Paulo, responsável pela execução, ainda não havia tomado medidas para penhorar os bens da empresa. A vara informou à Repórter Brasil que a execução está na fase de “verificação de cálculos”. O prazo é de 120 dias, apesar de ser um caso de violação de direitos humanos, o que exigiria uma resolução mais rápida.

“Quando o sistema de Justiça falha em dar uma resposta célere para esse problema,  essas famílias ficam na rota da revitimização. No Brasil, eles conseguem trabalho apenas dentro desse ciclo de exploração”, alerta João Paulo Dorini, defensor público federal. “Essa família deveria ter uma verba alimentar garantida até o final da tramitação do processo. Os casos de trabalho escravo não podem entrar na fila de outros processos”, ressalta a auditora fiscal do trabalho Lívia dos Santos Ferreira. Ambos atuaram no resgate da família boliviana.

O pagamento de indenizações costuma sair de forma rápida a resgatados do trabalho escravo, logo após as fiscalizações, pela via administrativa. No ramo têxtil, porém, as autuações geralmente ocorrem em oficinas terceirizadas, o que dificulta o pagamento. No resgate de Ana e João, os auditores tentaram um acordo com a Program, mas a empresa não aceitou. Por isso, a DPU teve que entrar na Justiça para cobrar os direitos trabalhistas devidos – e a empresa recorre, gerando morosidade e deixando os resgatados vulneráveis.

Atualmente, Ana e João chegam a entregar 300 peças de roupas por semana para agenciadores que recrutam mão de obra barata pela internet. Também costuram tapetes para uma ONG que os auxilia e recebem Auxílio Brasil. Ainda assim, com quatro crianças pequenas, as contas não fecham. 

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Fonte: Repórter Brasil

Data original da publicação: 25/11/2022

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