Emprego e desemprego no Brasil: a grande confusão.

Fonte da imagem: Saiba Mais RN

Por Jones Manoel | Boletim Semanal – 16/02/2025

Um dos maiores sintomas da miséria teórica e política generalizada que vivemos no Brasil são os debates atuais em torno do emprego e desemprego. Uma série de delírios, mentiras e absurdos circula com total desenvoltura e sem corar a face dos porta-vozes dessas falas. Começamos com a ideia de que o Brasil vive o pleno emprego, que a situação dos trabalhadores é ótima e que o povo não percebe isso por causa de problemas de comunicação do governo Lula (e fake news, as famosas mentiras da extrema-direita).

As estatísticas atuais medem ocupação e desocupação. É considerado ocupado aquele ou aquela que tem trabalho, não importa se formal ou não, com direitos ou não. Então, se você trabalha 10h por dia numa bicicleta ou moto entregando comida, trabalha 12h por dia dirigindo a partir da mediação e controle de um aplicativo ou passa 11h por dia vendendo algo numa estação do metrô, você está ocupado. O Brasil tem hoje 40 milhões de trabalhadores na informalidade, isto é, 38,6% da sua força de trabalho, os quais vivem sem férias, décimo terceiro, licença-maternidade/paternidade, vale-refeição ou quaisquer direitos que se possa imaginar. Já a taxa de desemprego entre os jovens de 18 a 24 anos foi de 14,3% em 2024 (2,2 milhões de jovens). Ao mesmo tempo, ainda em 2024, 85% das negociações salariais tiveram como resultado reajustes acima da inflação, segundo o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos). Um bom número? Claro que é positivo, mas a média geral do ganho salarial foi de apenas 1,37%. Ao passo que, no ano passado, nos empregos com carteira assinada, a média salarial foi de R$ 2.177,96 – menos de dois salários mínimos.

Todo esse festival de números mostra que temos altíssima informalidade, precarização do trabalho e empregos de baixos salários – além da forte presença da jornada de trabalho na escala 6×1. Estamos longe do pleno emprego.

No entanto, voltando aos números, esses 40 milhões de trabalhadores na informalidade querem estar nessa situação? Se consideram “empreendedores”? Não querem mais CLT? Essa é outra besteira repetida por vários setores progressistas, inclusive pelo presidente Lula. Diversas pesquisas indicam que trabalhadores na informalidade gostariam de ter carteira assinada, mas há dificuldade em encontrar emprego formal.

Em agosto de 2024, o Instituto Brasileiro de Economia da FGV (FGV-Ibre) divulgou uma pesquisa mostrando que 7 em cada 10 trabalhadores autônomos gostariam de ter sua carteira assinada. A mesma pesquisa indica que, segmentado por renda, considerando os trabalhadores autônomos com renda de até um salário mínimo, 75,6% desejam ter um trabalho com carteira assinada. Somente no grupo que ganha até três salários mínimos o desejo pela CLT cai significativamente, mas ainda assim segue majoritário: 54,6%.

Por fim, outra besteira que circula com força é a suposta complexidade indecifrável do apelo do ideal de empreendedorismo. A economia brasileira não gera empregos bons em massa (com altos salários, boas condições de trabalho etc.) há mais de 30 anos. A maioria da classe trabalhadora vive entre um emprego precário e outro, ganhando menos de dois salários mínimos, sofrendo toda sorte de humilhação, assédio moral, constrangimento e adoecimento mental. Mesmo um maior nível de qualificação – ter graduação, mestrado, doutorado etc. – não garante empregabilidade e muito menos bons salários ou condições de trabalho.

Há um desalento geral com a possibilidade de melhorar a situação econômica a partir do binômio estudo/emprego. É tão difícil assim entender o apelo de uma ideologia que diz que seu sucesso econômico depende apenas de você, seu disciplinamento, organização, foco e “mudança de mentalidade”? A ideologia do empreendedorismo ainda oferece a ilusão de fugir das humilhações do patrão, do caos urbano, de passar horas para ir e voltar do trabalho e da percepção – correta, inclusive – de que o nosso trabalho serve apenas para enriquecer o patrão, sem sinais de “prosperidade para todos”.

Em suma, o quadro brasileiro, bem parecido com o de outros países, sem negar as particularidades nacionais, aponta para algo básico: um cansaço, esgotamento e desesperança generalizados com empregos ruins, salários baixos, precarização, humilhação, aumento das jornadas de trabalho e constante adoecimento físico e mental. Não mobiliza ou encanta ninguém citar o aumento de alguma porcentagem pequena nas estatísticas de emprego, mantendo o quadro atual. O mal-estar geral, ainda que não formulado de forma consciente pela maioria do povo trabalhador, diz respeito ao aspecto qualitativo. Usando uma linguagem chula e popular na internet, resumiria assim: a maioria não aguenta mais vagas de emprego arrombadas.

Sem entender isso, focando apenas em circular números e estatísticas frias, a direita, a extrema-direita e os liberais vão conseguir orientar e capturar esse mal-estar a partir da ilusão do empreendedorismo. A votação espetacular de Pablo Marçal em 2024, na cidade de São Paulo, deveria servir de lição para uma reflexão geral nas esquerdas. Porém, 2024 já passou, e Hegel estava certo: a única coisa que a história ensina é que ela não ensina nada.

Enquanto isso, no chamado campo progressista, sumiu do vocabulário palavras como pleno emprego (o de fato, e não essa miragem estatística em voga). O governo Lula se nega a encampar a luta pelo fim da escala 6×1. A geração em massa de empregos de altos salários, embora proclamada no discurso, não está acontecendo e não vai acontecer, dado o padrão macroeconômico neoliberal que segue firme e forte. A revogação da contrarreforma trabalhista, promessa de campanha em 2022, já foi esquecida. A desesperança é cada vez maior, e é extremamente popular a ideia de sair do Brasil o mais rápido possível para tentar um emprego fora.

Enfim, o desalento é geral, mas enquanto o Titanic afunda, alguns violinistas cantam: é o menor desemprego da série histórica…

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