Escravos do fogo: 15 trabalhadores são resgatados de carvoarias no interior de Minas
Por André Cabbete Fábio | Repórter Brasil
“Entre os dias 18 e 19 de agosto, uma ação de fiscalização resgatou 15 trabalhadores em situação análoga à escravidão em duas carvoarias de Rio Pardo de Minas (MG). Eles trabalhavam com madeira em chamas e carvão sem proteção contra calor, fumaça, fuligem e pó — e sem máscaras próprias para evitar o contágio pelo novo coronavírus. Carregavam sacos de 40 kg nos ombros por uma escada bamba de madeira do chão até a carroceria de um caminhão, segundo auditores-fiscais do Trabalho que participaram do resgate.
O dormitório de uma das fazendas, chamada Natanael, recebia fumaça dos fornos de carvão noite e dia, que os trabalhadores respiravam inclusive durante o sono, segundo os fiscais. Em um dos quartos, dormiam respirando também os gases que emanavam de recipientes de 50 litros com gasolina e óleo diesel.
“Havia goteiras por toda parte da casa além do frio intenso em virtude da falta e vedação da casa. Toda a fumaça proveniente dos fornos de queima da madeira também atingia a moradia”, informou Cláudio Secchin, o auditor que coordenou a operação, ressaltando que nenhum deles tinha carteira assinada.
“Eles saíam do trabalho com o rosto tão sujo que mal conseguiam enxergar”, observa a defensora federal Vânia Nogueira, que acompanhou o resgate. Quando os auditores-fiscais chegaram em outra fazenda, chamada Renascer, viram funcionários lavando os rostos com água suja de uma caixa d’água destampada no chão.
“As jornadas eram exaustivas, sem hora para entrar ou sair. Em nenhum dos locais havia chuveiros funcionando, nos quais os trabalhadores pudessem se banhar antes de ir para alojamentos ou para casa”, completa Nogueira.
A ação contou com quatro auditores-fiscais do Grupo Especial de Fiscalização Móvel da Superintendência Regional do Trabalho, dois policiais federais e uma representante da Defensoria Pública Federal, que firmou um termo de ajuste de conduta com os proprietários.
Dez trabalhadores foram libertados da fazenda Natanael, de propriedade de Adauto Vianna Diniz. Outros cinco foram libertados da fazenda Renascer, da Aurora Reflorestamento e Transportes LTDA, empresa de João Hermes de Oliveira e de seu filho, Gabriel Hermes Mendes Oliveira.
Ambos também são donos da Florocarv Reflorestamento e Transportes LTDA, e João Hermes é presidente da Associação das Empresas Produtoras de Carvão do Norte de Minas que, segundo seu advogado, está, na prática, desativada.
Os donos da fazenda Renascer concordaram em pagar R$ 15 mil em direitos trabalhistas aos seus cinco trabalhadores resgatados, segundo Nogueira. Adauto Viana Diniz concordou em pagar R$ 45 mil aos dez trabalhadores resgatados da fazenda Natanael.
Além disso, as empresas ainda deverão pagar cerca de R$ 14 mil em multas por danos morais e individuais, e realizar adequações de infraestrutura. Deverão contratar um engenheiro do trabalho para projetar uma máquina que facilite o transporte do carvão do chão até a carroceria, e apresentar o projeto em 30 dias. Se cumprirem as determinações, evitam uma multa de R$ 100 mil — e ainda serem processadas pelo Ministério Público. (…)”
Fonte: Repórter Brasil
Data original da publicação: 02/09/2020