LMT#110: Hospedaria de Imigrantes do Brás, São Paulo (SP) – Odair da Cruz Paiva

Foto: Museu da Imigração/SP

Por Odair da Cruz Paiva | Laboratório de Estudos de História dos Mundos do Trabalho

A antiga Hospedaria de Imigrantes localizada no bairro do Brás na zona leste da cidade de São Paulo foi inaugurada em 1888 para servir como lugar de recepção, triagem e encaminhamento de trabalhadores nacionais e estrangeiros direcionados para as fazendas de café no interior do Estado. Antes dela, o alojamento de trabalhadores ocorreu na Hospedaria instalada no bairro do Bom Retiro cujo funcionamento se deu entre os anos de 1882 a 1887. O aumento do fluxo de trabalhadores no período pós abolição da escravidão fez com que o então governo provincial levasse a cabo a construção de uma Hospedaria com maior capacidade.

A administração da Hospedaria em seus primeiros anos esteve sob a responsabilidade da Sociedade Promotora de Imigração, criada em 1886 por fazendeiros de café para promover a imigração estrangeira para São Paulo. As relações destes cafeicultores com o então Governo Provincial permitiram com que a Sociedade administrasse a Hospedaria até 1892 quando a Secretaria da Agricultura passou a administrar o prédio. A instituição abrigava os trabalhadores que eram trazidos pela política de imigração subsidiada ou que aqueles que não possuíam familiares, amigos ou referências de emprego. 

A Hospedaria de Imigrantes fazia parte de um complexo de hospedarias criadas entre o final do século XIX e início do século XX em várias partes do mundo. Houve hospedarias de emigrantes, como no caso da Hospedaria de Kobe, no Japão que organizavam o fluxo de trabalhadores para a saída do país e as hospedarias de imigrantes, como a de São Paulo, a da Ilha das Flores no Rio de Janeiro a de Buenos Aires na Argentina e a da Ilha de Ellis em Nova Iorque. 

Na Hospedaria de São Paulo havia refeitório, dormitórios, farmácia, hospital, telégrafo, agencia postal e outras instalações como a Agência de Colocação para o direcionamento dos trabalhadores rumo às fazendas do interior. Segundo seus administradores, o tempo ideal para a permanência dos imigrantes era de três dias nos quais seriam realizados os registros, inspeções médicas, contatos e direcionamentos para o trabalho nas fazendas. Por vezes o tempo ideal era excedido por razões de saúde ou mesmo insatisfação com as ofertas de trabalho e salários.

Até meados dos anos 1920, os trabalhadores estrangeiros compunham a maioria dos hospedados em suas dependências. Os italianos representaram o maior grupo. A partir dos anos 1930, com a crise da cafeicultura e o aumento das atividades industriais em São Paulo os trabalhadores nacionais – vindos majoritariamente de Minas Gerais e dos estados do Nordeste – tornaram-se a maioria entre os alojados. A proximidade com a Estação do Norte (hoje Estação Roosevelt) facilitava a chegada destes homens, mulheres e crianças que substituíram a mão de obra imigrante tanto no campo como nas cidades. 

Embora fosse um lugar de passagem, imigrantes e migrantes tiveram naquele edifício o seu primeiro endereço. Os indícios de sua passagem estão inscritos nos Livros de Registro: neles encontramos o nome, a nacionalidade, o lugar de origem e de destino de aproximadamente 1,9 milhão de imigrantes e 1,6 milhão de trabalhadores nacionais. A riqueza destes dados faz com que a Hospedaria seja um lugar de memória importante para muitos que são descendentes destes homens e mulheres que tiveram na migração uma alternativa para uma vida melhor. Muitos ainda hoje procuram informações sobre seus antepassados para instruir os processos de dupla cidadania, para a produção de árvores genealógicas ou mesmo como um lugar de memória e de referência sobre o passado familiar e comunitário.

Vale lembrar que a história deste edifício está associada não apenas aos trabalhadores e trabalhadoras que por ali passaram. Enquanto um lugar de viabilização da política de mão de obra, a Hospedaria do Brás presenciou as várias transformações do mundo do trabalho por quase um século. De lugar de passagem para os trabalhadores direcionados para a cafeicultura, a Hospedaria também foi o primeiro endereço de milhares de trabalhadores empregados na construção civil e nas indústrias na cidade. De suas dependências saíram muitos dos que construíram a cidade de São Paulo tal qual a conhecemos hoje. 

Em 1978 a Hospedaria do Brás recebeu o último grupo de trabalhadores estrangeiros. No entanto, nas décadas seguintes manteve-se como um lugar de acolhimento de trabalhadores nacionais. Atualmente, parte da edificação é administrada pelo Arsenal da Esperança,  organização que abriga pessoas em condição de rua e estrangeiros. São oferecidas refeições, exames médicos, cursos de capacitação. A parte frontal da edificação abriga, desde 2014, o Museu da Imigração do Estado de São Paulo que desenvolve atividades educativas e exposições sobre os diversos aspectos da vida de migrantes e imigrantes de todas as nacionalidades incluindo as migrações recentes como as de bolivianos, chineses, haitianos e diversas correntes migratórias vindas de África, América Latina e Ásia. O Museu mantém trabalhos com comunidades de imigrantes e migrantes; desenvolve pesquisas, cursos, palestras e uma série de atividades voltadas para o público escolar. Lá são realizados anualmente a festa do imigrante e o festival de gastronomia.

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Fonte: Laboratório de Estudos de História dos Mundos do Trabalho

Data original de publicação: 09/06/2022

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