Plataformas digitais e o desmonte de direitos

Imagem: Divulgação

Por Maria Aparecida Bridi

Com o surgimento das empresas de plataformas digitais inaugurou-se uma nova forma de extração de trabalho humano: trabalhadores e trabalhadoras; eufemisticamente chamados de “parceiros”, “sócios”, “empreendedores”; que colocam gratuitamente à disposição das empresas o próprio carro, bicicleta, moto, celular e conexão à Internet. No Brasil, são mais de 1,5 milhão de pessoas trabalhando nessas plataformas e assumindo integralmente os custos e riscos do trabalho.

Tratam-se de empresas que vieram na esteira das inúmeras reformas laborais no Norte e Sul globais, as quais não apenas abriram uma avenida de trabalhos sem direitos, mas normalizaram tal forma de exploração entre consumidores e os próprios trabalhadores. Tais plataformas são estruturalmente fundadas na informalidade, com remuneração não vinculada ao tempo, mas a tarefa, de modo semelhante ao século XIX.

Neste quadro, um dos maiores desafios é a regulamentação com atribuição de direitos. De um modo ao mesmo tempo perverso e sofisticado, calcadas em modernas estratégias de marketing, as empresas disseminam o discurso da autonomia e flexibilidade e alimentam a tese de que a regulação de direitos inviabilizaria suas atividades no país. Negam quaisquer vínculos laborais, afirmando-se como meras empresas de tecnologia, cujos trabalhadores são “clientes”, dotados de autonomia e liberdade.

É inegável, porém, que são as plataformas que organizam e distribuem o trabalho; estabelecem rotas, viagens, regras, preços, punições e desligamentos e controlam os ganhos. Há ampla convergência entre os estudos sociológicos e jurídicos acerca do caráter subordinado desse tipo de trabalho.

Nestes primeiros dias de março, o intenso debate público sobre o reconhecimento da relação de trabalho recebeu uma pá de cal. Depois de um ano de “negociações”, o governo enviou ao Congresso um Projeto de Lei Complementar (PL) que cria, segundo Rodrigo Carelli, definitivamente a figura do trabalhador subordinado sem direitos.

Com a divisão dos trabalhadores em torno da regulação, as dificuldades de ação coletiva e do discurso neoliberal de demonização da CLT, as empresas continuarão a acumular bilhões à custa da total desresponsabilização sobre o trabalho.

Maria Aparecida Bridi é Professora do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal do Paraná


CARELLI, R. Subordinação sem direitos: o projeto de lei Nem-Nem do governo federal. In: https://jornalggn.com.br/economia/subordinacao-sem-direitos-o-projeto-de-lei-nem-nem-do-governo/

IBGE, 2023

Fonte: Thaís Lapa, Presidenta da ABET (2024-2025)

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