Trabalhadores em plataformas digitais e a pandemia da Covid-19: O necessário reconhecimento do vínculo de emprego
Por REMIR | Jornal GGN
“Períodos de crise e situações excepcionais nos permitem enxergar realidades que costumam não ser problematizadas cotidianamente, dando-nos a oportunidade de buscar soluções para reduzir danos e garantir a dignidade necessária para a convivência social.
A pandemia do SARS-Cov-2, que causa a Covid-19, explicita as contradições que já vinham sendo enfrentadas no âmbito da regulação dos arranjos contratuais empresariais mobilizados pelas empresas detentoras de plataformas digitais. Essas empresas e o Estado vêm negando aos trabalhadores toda e qualquer proteção social, em particular aquela decorrente do vínculo de emprego. Desse modo, o rol dos riscos sociais daqueles trabalhadores que se submetem às condições de trabalho programadas pelas empresas por meio de algoritmos é levado ao limite, a partir de uma exposição direta a um vírus letal.
As autoridades da área de saúde de todo o mundo vêm recomendando o isolamento social como a medida mais efetiva de proteção contra a contaminação. A doença ou suspeita de doença implica a necessidade de quarentena ou isolamento social, mantendo a remuneração para os trabalhadores com vínculo de emprego (art. 2º, II, e 3º, II e § 3º da Lei 13.979/2020). Há também demandas específicas para os trabalhadores integrantes de grupos de risco, para aqueles que têm demandas familiares de cuidado, com crianças ou idosos, ou até mesmo para os que coabitam com pessoas hipervulneráveis à Covid-19.
Em sentido contrário a essas recomendações, as condições de trabalho impostas pelas empresas que se denominam plataformas digitais fazem com que os trabalhadores sucumbam aos termos de trabalho definidos por meio de seus algoritmos, em uma situação de absoluta precariedade e desproteção social. Havendo demanda da empresa detentora de plataforma digital que presta serviços, o trabalhador é mantido nas ruas trabalhando, sem qualquer proteção real à contaminação pela Covid-19 e, na ausência de demanda, não percebe qualquer remuneração.
As pesquisas com trabalhadores em plataformas digitais, fomentadas pela REMIR – Rede de Estudos e Monitoramento Interdisciplinar da Reforma da Trabalhista, constituída por pesquisadores/as das relações de trabalho dos mais diversos campos do conhecimento, evidenciam que a diferença existente entre estes e os demais assalariados consiste, basicamente, em terem a condição de empregados negada por seus empregadores. Ao designar esses trabalhadores como autônomos ou empresários de si mesmos, as empresas que se autodenominam como “aplicativos” ou “plataformas”, valem-se de uma estratégia para convencer o público e, muito particularmente, as instituições reguladoras, da inexistência de vínculo de assalariamento entre elas e os trabalhadores em plataforma digital.
Diante disso, a REMIR vem a público se manifestar sobre a urgência de proteção social a esses trabalhadores, por meio do reconhecimento da existência de uma relação de emprego entre os trabalhadores e as empresas detentoras de plataformas digitais, bem como demonstrar sua consternação com as decisões judiciais proferidas no Brasil que negam esse direito aos empregados dessas empresas.”
Fonte: Jornal GGN
Data original de publicação: 23/04/2020