Ocupação e desemprego sugerem que juros poderiam cair mais rapidamente
Por Lauro Veiga Filho | Jornal GGN
As marcas históricas registradas pela edição mais recente da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), não correspondem precisamente a novos recordes, quando analisadas sob a perspectiva da mesma série estatística e considerando outros indicadores. Não se trata de contestar os dados trazidos pela pesquisa, referentes ao trimestre entre setembro e novembro do ano passado, mas de apresentá-los em perspectiva diversa, numa contribuição ao debate sobre o suposto “sobreaquecimento” do mercado de trabalho, avaliação que tem sido mencionada como justificativa para que o Banco Central (BC) mantenha a moderação descabida aplicada ao processo de redução dos juros básicos.
Ao contrário do que sugere esse tipo de argumento, o comportamento recente da ocupação e do desemprego sugere que os juros poderiam estar em queda mais acelerada sem que isso pudesse concorrer para gerar pressões adicionais sobre a inflação, supostamente insufladas pelo incremento insustentável da atividade econômica e, portanto, da demanda doméstica. Num complemento, o ritmo apresentado pela economia na segunda metade de 2023 mostra uma atividade já em desaceleração, o que tende a corresponder a pressões menos intensas sobre os preços em geral.
Conforme já registrado pela imprensa, a população ocupada atingiu no trimestre encerrado em novembro seu mais nível desde o início da série histórica mais recente do IBGE, em 2012, somando 100,508 milhões de trabalhadores com algum tipo de ocupação. No mesmo trimestre, a força de trabalho – o total de trabalhadores com 14 anos ou mais empregados ou em busca de um emprego no período da pesquisa – representou por mais de 62,0% da população em idade ativa (todos aqueles com idade igual ou superior a 14 anos), o que significa dizer que 108,710 milhões de trabalhadores encontravam-se ocupados ou estavam desempregados, mas mantinham-se a procura de uma colocação, diante de 175,229 milhões com 14 anos ou mais de idade.
Desemprego mais alto
Para comparação, entre julho e outubro de 2019, em torno de 63,8% da população em idade ativa estava na força de trabalho, num recorde para a série histórica até o momento. Caso a mesma proporção tivesse sido observada na PNADC realizada entre setembro e novembro deste ano, a força de trabalho estaria mais próxima de 111,796 milhões, em torno de 3,086 milhões a mais do que o dado de fato registrado pela pesquisa – ou 2,8% a mais. Considerando que a economia teve fôlego para gerar aquelas 100,508 milhões de vagas, o número de desempregados teria experimentado um salto de 37,6%, atingindo algo não muito distante de 11,288 milhões. Obviamente, a taxa de desocupação, atualmente em torno de 7,5%, também avançaria, aproximando-se de 10,1%. Apenas para comparar, a taxa de desemprego estaria não muito distante daquela observada no trimestre entre fevereiro e abril de 2022, quando havia alcançado 10,5%.
Falso “pleno emprego”
Nitidamente, quando colocados em perspectiva, os dados do mercado de trabalho não parecem corroborar os diagnósticos que sugerem uma economia próxima do “pleno emprego”, ou seja, quando se considera que o total de pessoas ocupadas teria alcançado uma espécie de teto “mágico” a partir do qual os salários tenderiam a subir crescentemente, levando as empresas a aumentarem seus preços para preservar margens de lucro, gerando o que os economistas chamam de “espiral preços-salários” – uma “corrida” entre preços e salários, produzindo taxas de inflação igualmente crescentes.
Adicionalmente, o recorde na população ocupada veio acompanhado de números históricos para a informalidade, embora proporcionalmente o percentual de informais não tenha repetido o mais elevado da série, registrado no trimestre junho a agosto de 2022, quando havia representado 39,7% do total de ocupados. Entre setembro e novembro deste ano, em torno de 39,4 milhões de trabalhadores não dispunham de carteira assinada e nem de registro no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ), representando 39,2% do número de ocupados em toda a economia.
Na passagem do trimestre móvel encerrado em agosto para aquele concluído em novembro, o número de informais aumentou 1,1%, num acréscimo de 416,0 mil, o que representou quase metade (48,8%) do total de novas ocupações geradas pela economia no mesmo período (853,0 mil vagas adicionais). Em comparação com o trimestre setembro a novembro de 2022, o total de trabalhadores informais cresceu 1,5% e significou a criação de 592,0 mil vagas. Esse número, por sua vez, representou 72,6% das novas ocupações abertas pela economia nos mesmos 12 meses, num total de 815,0 mil.
Pressões pontuais
A elevação relativa da inflação no final do ano passado decorreu de pressões pontuais e concentradas em setores específicos, além de um menor ritmo de baixa nos preços dos combustíveis, de certa forma até natural diante das quedas observadas nos meses anteriores. No fechamento de dezembro, num exemplo, o Índice de Preços ao Consumidor Semanal (IPC-S), do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), elevou-se para 0,29% e passou acumular, em 12 meses variação de 3,55% (quer dizer, praticamente no centro da meta inflacionária, caso fosse este o índice oficial definido pelo Conselho Monetário Nacional).
Na quadrissemana anterior, encerrada em 22 de dezembro, o IPC-S havia registrado variação de 0,18%, em tendência de baixa frente a 0,33% na primeira quadrissemana do mês. A elevação mais recente deveu-se principalmente à alta dos alimentos, que experimentaram avanço médio de 1,01% frente a 0,60% na quadrissemana imediatamente anterior e a 0,47% nos 30 dias de novembro.
A alta deveu-se principalmente aos impactos do clima sobre a oferta de hortaliças e verduras, que vinham subindo a um ritmo mensal de 3,36% até à quadrissemana terminada no dia 22 de dezembro e saltaram 7,07% nas quatro semanas fechadas do mesmo mês – uma pressão pontual, sem qualquer relação com o comportamento da demanda, já que causada essencialmente pelas temperaturas excessivamente elevadas e pelas chuvas irregulares.
Lauro Veiga Filho – Jornalista, foi secretário de redação do Diário Comércio & Indústria, editor de economia da Visão, repórter da Folha de S.Paulo em Brasília, chefiou o escritório da Gazeta Mercantil em Goiânia e colabora com o jornal Valor Econômico.
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Fonte: Lauro Viega Filho | Jornal GGN
Data original de publicação: 03/01/2024