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Caso de escravizada na casa de desembargador de SC entra na Lista Suja

Fonte: Reprodução/TV Globo e Divulgação/TJSC)


Lista Suja do trabalho escravo incluiu 155 novos nomes de empregadores autuados por submeter trabalhadores a condições análogas à escravidão; Oba Hortifruti e terceirizada do Rock in Rio também estão no cadastro


Por Diego Junqueira, Isabel Harari, Igor Ojeda e Leonardo Sakamoto
Edição de Carlos Juliano Barros | Repórter Brasil


ANA CRISTINA GAYOTTO DE BORBA – esposa do desembargador do Tribunal de Justiça de Santa Catarina Jorge Luiz de Borba – é um dos 155 novos nomes incluídos na Lista Suja do trabalho escravo, atualizada nesta quarta-feira (9) pelo governo federal.

Num caso de repercussão internacional, uma fiscalização conjunta de cinco órgãos públicos concluiu que Ana Cristina manteve Sônia Maria de Jesus em regime de trabalho escravo doméstico por quase 40 anos na residência da família Borba, em Florianópolis. Ela e o marido, no entanto, negam qualquer irregularidade.

Também entraram a rede varejista Oba Hortifruti e Marcos Rogério Boschini, genro de um dos condenados pela chacina de Unaí (MG), de 28 de janeiro de 2004, em que quatro servidores do MTE (Ministério do Trabalho e Emprego) foram assassinados. Além deles, uma prestadora de serviços do Rock in Rio, pecuaristas invasores da Terra Indígena Apyterewa (PA), produtores de café e de carvão vegetal estão na relação.

Divulgada pelo MTE desde novembro de 2003, o cadastro é atualizado semestralmente. Ele torna públicos os dados de pessoas físicas e jurídicas responsabilizadas por submeter trabalhadores a condições análogas às de escravo.

Os nomes são incluídos após os empregadores autuados em fiscalizações do governo federal exercerem o direito de defesa em duas instâncias na esfera administrativa, e permanecem no sistema por dois anos. Eles podem fazer acordos para irem para uma lista de observação, o que demanda o cumprimento de uma série de critérios e compensações.

Apesar de a portaria que regulamenta a Lista Suja não impor bloqueio comercial ou financeiro às pessoas citadas, a relação tem sido usada por bancos e empresas para gerenciamento de risco, dentro e fora do Brasil. Por essa razão, as Nações Unidas consideram o instrumento um exemplo global no combate ao trabalho escravo.

Na atualização desta quarta-feira, as atividades econômicas com maior número de novos empregadores são criação de bovinos (21), cultivo de café (20), trabalho doméstico (18), produção de carvão vegetal (10) e extração de minerais diversos (7). Com a atualização, a lista passa a contar com um total de 745 nomes (veja todos aqui).

Ana Cristina entrou para a lista após ser autuada pelos auditores fiscais do MTE em junho de 2023, durante a operação que resgatou Sônia Maria de Jesus. No auto de infração, o nome de Ana Cristina aparece como empregadora. Por essa razão, foi ela a incluída na Lista Suja. Apesar de o casal ser apontado como o responsável pela exploração da trabalhadora, os auditores identificaram um número maior de elementos de subordinação entre Ana Cristina e Sônia.

A família sempre negou que Sônia atuasse como doméstica e alega que ela é membro da família. Durante o resgate, porém, os auditores fiscais descobriram que Sônia, aos 50 anos na época, trabalhava para a família desde os 9, quando foi levada de uma creche na Grande São Paulo pela mãe de Ana Cristina, Maria Leonor Gayotto.

Sônia trabalhava na residência dos Borba cuidando de Maria Leonor e exercendo tarefas domésticas, como arrumar as camas, passar a roupa e lavar a louça. Além de não ter carteira de trabalho, salário, descanso remunerado, férias, 13º e outros direitos, Sônia também tinha passado a maior parte da vida sem documento de identidade, o qual obteve apenas em 2019.

Cega de um olho e surda, Sônia também não havia sido alfabetizada em Libras (língua brasileira de sinais) nem em português, comunicando-se por gestos. Segundo a fiscalização, ela fazia refeições com as demais empregadas e dormia ora em um quarto anexo à área de serviço da residência (onde ficavam seus pertences), ora em um quarto de hóspedes dentro da casa.

Após o resgate, o casal negou todas as acusações, disse que Sônia foi criada como filha e entrou com ação para ela ser restituída ao convívio dos Borba. Com aval do STJ e do STF, tiraram Sônia de um abrigo e a levaram de volta para casa, apenas três meses após o resgate. A situação levou organizações sociais e sindicatos a pedir à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, órgão ligado à OEA (Organização dos Estados Americanos), que o Brasil seja questionado sobre o caso.

O processo ainda deve ser analisado pela 2ª Turma do Supremo. O desembargador e a esposa ingressaram também com pedido de paternidade socioafetiva. A advogada da família foi procurada novamente pela reportagem, mas não houve retorno. O espaço segue aberto a manifestações.


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Data original de publicação: 09 de abril de 2025

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