Ebook | Economia dos Setores Populares: O trabalho para além da norma salarial

Por Gabriel Kraychete

Confira o Ebook “Economia dos Setores Populares”, de Gabriel Kraychete, publicado neste ano pela Editora Oikos

Trecho da Introdução:

“As políticas de inserção social pelo trabalho são compostas, predominantemente, pelo seguro-desemprego e por programas voltados para a (re)qualificação profissional e intermediação de mão de obra. Tradicionalmente, esses programas têm por fio condutor o emprego regular assalariado.

A partir dos anos 1990, quando se desvanecem as expectativas de criação em larga escala de empregos regulares, surgem os programas em apoio ao empreendedorismo (microcrédito e incentivo à formalização dos pequenos negócios), que têm por substrato uma corrente neoliberal4, segundo a qual cada “indivíduo é uma empresa que deve se gerir e um capital que deve se fazer frutificar” (DARDOT; LAVAL, p. 7, 2016). Mais recentemente, como resultado das lutas sociais, institucionaliza-se, ainda que de forma residual e periférica, programas em apoio à economia solidária como um caminho alternativo para a inserção social pelo trabalho.5

Assim, à exceção do apoio à economia solidária, os pressupostos subjacentes às políticas de inserção social pelo trabalho têm por referência primordial o trabalho assalariado organizado – seja como condição de acesso, no caso do seguro desemprego, seja como referência de destino, no caso das ações de qualificação e intermediação –, e o trabalhador visto como detentor de um capital humano, um empreendedor de si mesmo, a quem caberia implantar o seu trabalho, tendo a si próprio como sua melhor mercadoria.

Considerando que o Brasil não conheceu os índices de assalariamento das economias capitalistas centrais, e que aqui nunca houve uma “sociedade salarial” entendida como o predomínio do emprego assalariado regulado pelo Estado, este livro busca responder à seguinte indagação: as categorias de análise habitualmente utilizadas nos programas oficiais de inserção social pelo trabalho conseguem captar a dinâmica efetiva do cotidiano dos agentes que integram a economia dos setores populares, ou seja, a sociabilidade dos trabalhadores e suas famílias? A hipótese que desenvolvo é que há uma desconexão entre as categorias centrais que orientam as políticas de inserção pelo trabalho e a dinâmica efetiva do cotidiano dos agentes populares no Brasil. Na imagem proporcionada por Morin (2013, p. 19), “não é apenas a nossa ignorância; é também o nosso conhecimento que nos cega”. As próprias categorias estatísticas tomam por base esse referencial, de modo que o dimensionamento da economia dos setores populares supõe reagregar as atuais bases de dados. Portanto, a insuficiência dessas políticas de inclusão pelo trabalho não é apenas programática, mas envolve, também, uma problemática conceitual6. Há um desbordamento da realidade sobre as categorias de análise usualmente utilizadas para o entendimento da estrutura ocupacional e do mercado de trabalho, diluindo e tornando informes as fronteiras que permitem identificar o que há de específico e característico à economia dos setores populares7. Entretanto, as categorias de análise retroagem sobre as estruturas, influenciando-as (IVO, 2008b). Repõem-se, assim, do ponto de vista analítico, as condições que reproduzem e consagram a disjunção entre cidadania e trabalho. Ou seja, repõem-se e consagram-se, a partir do âmbito teórico/conceitual, e também estatístico, as condições que restringem a “universalização de uma cidadania embasada nos direitos sociais do trabalhador”8. Em outros termos, restringem-se as possibilidades de inserção social de um segmento expressivo de trabalhadores, que, ao serem primordialmente categorizados segundo as normas do emprego assalariado, numa sociedade que não universalizou as relações de assalariamento, estariam, do ponto de vista analítico, desde sempre e para sempre, compelidos a permanecerem aonde estão.

Tendo por fundamento autores como Fernand Braudel (1985a; 1996), Paul Singer (1970), Milton Santos (2000), Razeto (1993) e Coraggio (1998; 2000), defende-se, neste livro, a noção de economia dos setores populares, entendida como o trabalho realizado de forma individual ou familiar e as diferentes modalidades de trabalho associativo, denominados como empreendimentos econômicos solidários. Essa economia possui uma dinâmica peculiar, marcada pela necessidade de prover e repor meios de vida, ancorada na utilização de recursos humanos próprios, englobando, portanto, unidades de trabalho e não de inversão de capital. Supera, assim a noção formal de setor ou ramo de atividade, mas abarca a dinâmica específica das classes populares nas condições de reprodução social da vida. (…)”

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