“Eles trabalhavam com sede”, diz auditor fiscal do trabalho sobre resgatados em Uruguaiana

Imagem: Polícia Federal/Divulgação/GZH

Por Lucas Abati | GZH

Uma rotina marcada por sede, fome e jornadas excessivas sob sol escaldante no verão. É dessa forma que o auditor fiscal do trabalho Vitor Siqueira Ferreira resume as condições em que viviam os 82 trabalhadores resgatados em Uruguaiana, na última sexta-feira (10), em duas fazendas de arroz.  

— Não era fornecido água, eles precisavam levar. E se essa água acabava, por qualquer motivo, eles trabalhavam com sede. Na hora do almoço, muitas vezes, eles se surpreendiam porque a comida estava azeda. Azeda porque estava mal acondicionada, dentro de uma mochila no sol — contou o auditor. 

Ferreira ainda acrescenta que os próprios trabalhadores se organizavam para garantir que ninguém ficasse totalmente sem comida:   

— Aqueles que não tinham a comida azedada repartiam comida com todos os presentes. O descanso era sob a sombra de árvores se tivessem sorte. Porque muitos lugares não têm sombra. 

O grupo foi localizado nas estâncias Santa Adelaide e São Joaquim, após uma denúncia informar sobre a presença de adolescentes nas propriedades, sem carteira assinada e com condições irregulares. Todos eram de municípios da Fronteira Oeste, em especial Itaqui, São Borja, Alegrete e Uruguaiana.

A operação conjunta entre o Ministério Público do Trabalho (MPT), o Ministério do Trabalho e Emprego e a Polícia Federal em Uruguaiana constatou que entre os resgatados, 11 eram adolescentes, com idades entre 14 e 17 anos.  

O grupo era contratado para fazer o corte do arroz vermelho, que é uma gramínea que cresce junto do arroz e provoca perdas à lavoura. Os próprios trabalhadores deveriam providenciar instrumentos de trabalho, e a aplicação de agrotóxicos era feita sem equipamento de proteção individual. 

No mesmo local, um homem de 56 anos foi preso em flagrante. Segundo a Polícia Federal, ele era o responsável por levar os trabalhadores para as duas fazendas.  

— Todos declararam que o indivíduo que foi preso era o responsável pela contratação, era o responsável pelo aliciamento desses trabalhadores, inclusive dos menores. Foi dada voz de prisão para ele — disse o delegado federal Gilberto Kirsch Junior.

No sábado (11), o homem ganhou liberdade provisória e deixou a cadeia.  

GZH tenta contato com as estâncias citadas. 

A Federação das Associações de Arrozeiros do Estado do Rio Grande do Sul (Federarroz) se manifestou ainda no sábado (11), por meio de um comunicado intitulado “Nota Pública à Sociedade Brasileira” (leia íntegra abaixo), assinado pelo presidente da entidade, Alexandre Azevedo Velho, e pelo vice-presidente Roberto Fagundes Ghigino.

Leia a nota da Federarroz na íntegra

“A Federação das Associações de Arrozeiros do Estado do Rio Grande do Sul – FEDERARROZ, vem, a público, tendo em vista seu compromisso irrestrito com o Estado Democrático de Direito e o respeito às Leis do país, sem prejuízo da missão de assegurar a segurança alimentar do povo brasileiro, externar o que segue.

Verifica-se a divulgação, por meio de canais de comunicação e veículos de imprensa, que, em operação organizada por órgãos estatais, se procedeu à identificação de pessoas laborando, “em área rural do Estado, “em desrespeito às regras trabalhistas vigentes e em condições análogas à escravidão”.

Com efeito, a Federarroz, entidade que representa os produtores de arroz do Rio Grande do Sul, Estado que é responsável por mais de 70% (setenta por cento) da produção nacional do cereal, ressalta que estará acompanhando as apurações decorrentes do caso concreto, de modo a colaborar com seus devidos esclarecimentos.

A par do exposto, os fatos narrados reclamam parcimônia, por parte dos órgãos de fiscalização, imprensa, sociedade civil, entre outros agentes envolvidos, na medida em que, tendo em vista o ordenamento jurídico brasileiro, o possível não cumprimento de regras trabalhistas vigentes não culminam, necessariamente, na possibilidade de enquadramento dos fatos como “análogo a escravidão”, vez que a Legislação e a jurisprudência pátria exigem o preenchimento de requisitos específicos para a configuração efetiva da previsão legal e, por conseguinte, para punição dos respectivos responsáveis.

A Federarroz reitera os compromissos da lavoura de arroz do Estado do Rio Grande do Sul com a construção de um país e uma sociedade livre, justa e solidária, mediante o desenvolvimento e compatibilização dos aspectos econômico, sociais e ambientais, como a forma de erradicar a pobreza e reduzir as desigualdades sociais e regionais, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.”

Clique aqui para ler a matéria na íntegra

Fonte: GZH

Data original da publicação: 13/03/2023

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