A Luta de classes no Capitalismo Cognitivo no filme “Parasita”, por Wilson Ferreira

Imagem: Reprodução Youtube

Por Wilson Ferreira

O diretor sul-coreano Joon-ho Bong é um especialista no tema luta de classes. Seus filmes como O “Expresso do Amanhã” e “Okja” são variações sobre um tema cada vez mais aprofundado pelo diretor. Até chegar a “Parasita” (Gisaengchung, 2019), Palma de Ouro em Cannes, sua reflexão mais profunda tomando como cenário o chamado “Capitalismo Cognitivo”: “não-pessoas” com seus celulares e cercados de tutoriais e aplicativos, prontos para subempregos terceirizados – forma avançada de capitalismo na qual os patrões tornam-se invisíveis e a luta de classes oculta em camadas de apps. Desempregados e “uberizados”, a família Kin-taek passa a se interessar pela família Park. Ricos, terceirizam na sua residência todos as necessidades cotidianas. É a chance dos Kin-taek arrumarem um emprego mais estável. Mas uma perturbadora revelação trará consequências catastróficas para todos os envolvidos.

Lá no distante ano de 1982, a filósofa Marilena Chauí dizia em uma matéria na revista Isto É: “não tenho empregada porque não quero levar a luta de classes para dentro de minha casa”. Eram épocas da ascensão do PT após as grandes greves dos metalúrgicos na região do ABC/SP e Lula firmava-se como líder político. O grande tema era a luta de classes decorrente do eixo Capital versus Trabalho e as formas capitalistas de expansão da exploração (a “mais-valia”) e suas expressões políticas, como a própria ditadura militar do período.

Porém, o capitalismo sofisticou-se política e tecnologicamente e o eixo Capital-Trabalho não ficou mais tão exposto. Por assim dizer, a luta de classes se “capilarizou” com o crescimento da “uberização” e os trabalhos mediados por plataformas tecnológicas atrás das quais os patrões tornam-se invisíveis.

Capilarizada, a luta de classes deixa de ser exclusiva do eixo clássico do Capitalismo para se espalhar pela sociedade através terceirização de qualquer atividade: o Capital criou uma elite da alta administração e finanças (CEOs, diretores, altos executivos etc.) com polpudas remunerações e bônus. Da criação dos próprios filhos à prosaica compra num supermercado, tudo se torna objeto de terceirização para essa nova elite: alguém será pago para fazer serviços que, outrora, a própria família dava conta.

Daí, o temor da filósofa da USP: trazer a luta de classes para um novo eixo – a própria vida doméstica. Principalmente na atualidade, na qual a uberização e terceirizações generalizadas alargam ainda mais o fosso da desigualdade social.

Esse é o tema do filme sul-coreano Parasita (Gisaengchung, 2019) do diretor Joon-ho Bong. Um especialista em filmes sobre conflitos de classes, incluindo Expresso do Amanhã (Snowpiercer, 2013) e Okja (2017). Mas Parasita é o filme mais ousado em sua análise sobre as desigualdades estruturais do capitalismo moderno (Capitalismo Cognitivo) – de como alta tecnologia, a flexibilização das relações trabalhistas e a radicalização da meritocracia empurram o ressentimento social a situações tragicômicas.

O pano de fundo de Parasita é o empobrecimento e o acirramento da desigualdade na Coréia do Sul atual – após o desmoronamento de um contrato social confuciano de décadas (empregos vitalícios e um equilibrado sistema de aposentadorias) provocados pela imposição do pensamento único de um neoliberalismo triunfante, hoje o país convive com 30% das famílias abaixo dos níveis de pobreza.

Tragédias sociais como a transformação de homens e mulheres em “não-pessoas”, cidadão abandonados por falta de lugar na vida social, e a condição extrema de pobreza na qual famílias não conseguem nem recuperar o corpo de um familiar falecido para um velório digno, são cenas comuns na Coréia do Sul.

Confira a notícia completa clicando aqui.

Fonte: GGN
Data original de publicação: 22/09/2019

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